É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.
Eugénio de Andrade, As Palavras Interditas
Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas
Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio
Não posso adiar
ainda que a morte pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação.
António Ramos Rosa, Não posso adiar o coração
Caiu do céu uma estrela
Ai, que eu bem a vi tombar!
Era a noite pura e bela,
Murmurava ao longe do mar...
Era tudo êxtase e calma,
Perfume, encanto, fulgor...
Só no fundo da minha alma
Que desconforto e que dor!
Dome e sonha, minha bela,
Embalada ao som do mar...
Caiu do céu uma estrela...
Ai de mim que a vi tombar!
Antero de Quental (1887)
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